Terremoto na Indonésia. Dizem os medidores que de grande magnitude. Confesso que pra mim, brasileira, moradora do sudeste, o maior gemido da natureza já sentido são as enchentes das chuvas de janeiro, cuja responsabilidade sempre pode ser atribuída ao prefeito e as suas obras de fins meramente eleitoreiros, seja qual for o prefeito.
Rápido, assustador e definitivo. Assim, poderoso, podemos classificar um evento que derruba e destrói sem pedir nem perguntar. De pouco ou nada adianta o grito. A ajuda se vier, não vai minorar a dor. As perdas são tantas que o plano para o futuro é jamais buscar só pra não ter o que perder; pra não ser novamente privado do que tanto se quis. Os piores abalos talvez sejam os externos, mas indubitavelmente não tão transformadores.
Toda vida tem terremoto. Toda terra treme. São tremores anônimos, por vezes silenciosos, As estruturas que sustentam circunstâncias, condições e recursos são abaladas rápida, assustadora e definitivamente. Os mais corajosos podem resistir, os mais sábios se adaptar...É o seu modo próprio de lutar. De preferência em silêncio, porque por mais alentadores que choro ou grito pareçam o desabafo rouba a energia que deve ser canalizada de forma mais perene. Quando as coisas parecem ruir é o menos aconselhável. Por alguma razão quanto menor o alarde menor a destruição. Ao invés de espernear (deixe o luto pra depois, ora) tente salvar alguma coisa. Não há muito tempo pra escolher, mas há parâmetros a considerar.
Em um desastre natural, superado o primeiro impulso de agarrar qualquer coisa mesmo que inútil, tem-se por base o quanto custou obter ou a validade deste ou daquele objeto. Ou ente. Em geral salva-se apenas a própria vida, ou os filhos, ou a televisão. O que vier primeiro. Nos desastres fora das escalas, nem sempre se escolhe tão bem. Debaixo de grande risco tenta-se salvar a pele, a reputação, o emprego; ou o que for mais vergonhoso abdicar. Poucos optam por resguardar sua integridade, sua fé, sua esperança, ou sua inocência; ou o que for mais danoso perder.
C.S.Lewis diz que tudo que não é eterno é eternamente inútil. Em condições normais qualquer um consideraria insensato salvaguardar coisas que podem ser substituídas, ou até mesmo prescindidas. Mas a verdade é que no bojo dos acontecimentos tal clareza de espírito é turvada e tendemos a proteger o que menos importa, ao menos para sobrevivência do que realmente importa. Aos que não crêem que a eternidade seja real, pensar na posteridade não deixa de ser um bom termômetro. A troco de que deveria eu sofrer por uma coisa que tem pouca ou nenhuma utilidade, que não me fará crescer, nem há de me consolar, por mais paradoxo que isso possa parecer, no tempo incontestável da reconstrução? Sim, porque o “grande” propósito do “grande” terremoto é gerar um movimento, um inconteste e profundo modificar no ser, no sentir, no agir, no pensar. Um amigo, dias desses, disse algo que arrancou de mim uma sonora gargalhada. Disse ele que o ano de 2006 havia sido tão ruim que merecia ser homenageado em vez de esquecido, porque de tão ruim que fora o fez saltar da panela antes que começasse a água começasse a ferver... Rio-me de novo com a propriedade do símile. Dois mil e seis foi o ano do meu terremoto. Processo longo será esse o da reconstrução de algumas coisas, mas, para o bem de minh’alma, as coisas que se perderam, me parece, são fáceis de serem substituídas; tenho verificado quais das que se foram me é favorável preterir... Ainda contabilizo com quais valores sobrevivo.Assusto-me com as coisas tolas que tentei carregar e me confundo tentando recolocar as que trouxe. Alegro-me quando me deparo com as essenciais que mantenho comigo. Ainda rio de mim mesma esbaforida, gestos sôfregos e desesperados quando tudo quis cair por cima de mim.
Mas de tudo que passou algumas certezas acabei definindo e podem, então, servir de guia: a primeira é que não há menor garantia que não virão outros. Contrariamente há mais um dado estatístico que qualquer outra coisa: Terremotos se seguem e se dão sempre nas mesmas áreas. E nas mesmas circunstâncias. Há focos de tensão. A mim só resta atentar quais sejam. Prevê-los e aprender sempre a carregar apenas o que importa, pra que o próximo doa menos, sirva mais e dure pouco. No jargão dos sábios entendidos a científica constatação: “Considerando a magnitude do terremoto, pode ser que haja novos tremores residuais durante uma semana”. No dizer do meu coração: “Por favor, terra, trema pouco”. Por ora, trema pouco.
{mrs.anaterra}